Friday, April 28, 2006

"A UM assistirá novamente à eleição do Reitor"

"Independentemente da lucidez do diagnóstico traçado por Moisés Martins no texto em que manifesta a sua intenção de se candidatar a Reitor, a verdade é que quando pretende convocar-nos, a todos, para o combate que considera urgente, por uma outra ideia de Universidade, existe uma manifesta desproporção entre o apelo à mobilização cívico-académica e os meios de participação activa ao alcance de cada um de nós.

É claro que o seu apelo não é meramente retórico e que, por diversas formas, vários têm sido aqueles que se têm recusado a alienar as suas responsabilidades académicas e ético-políticas ao longo dos últimos anos. A participação crítica e cidadã conhece certamente múltiplas formas de expressão na Universidade, no dia-a-dia do fazer académico, mesmo quando se exprime longe das grandes arenas formais, das lógicas mediáticas ou dos desejos, de resto legítimos, de protagonismo individual ou colectivo.

É porém inegável que o processo de participação na decisão, no que à eleição do Reitor se refere, se encontra profundamente amputado, transformando a maioria de docentes, estudantes e funcionários em meros espectadores da escolha realizada por uns poucos. Esta concepção de democracia demasiado formalista e procedimental agrava seguramente a já de si complexa crise de legitimidade da instituição universitária, reflectindo-se na falta de vigor da representação e da reivindicação perante o Estado e outros poderes e, talvez, na própria condição periférica que vem sendo atribuída nos últimos anos ao Conselho de Reitores.

Sabe-se que a entorse democrática ou, no mínimo, o seu carácter indirecto e mediado, bem mais típico da lógica de "contagem de espingardas" que tende a contaminar os colégios eleitorais, não constituiu opção particular dos Estatutos da UM no seu artigo 15º, onde se define a Assembleia da Universidade. Pelo contrário, foi oportunamente tentada uma alternativa mais
pioneira por Lúcio Craveiro da Silva, mas não contemplada pela Lei daAutonomia Universitária de 1988.

Não tendo, aparentemente, defensores, esta norma arrisca-se contudo à cristalização jurídico-formal, afastando quase toda a Universidade da ingerência legítima numa das decisões mais substantivas - a escolha de um programa de acção e dos respectivos protagonistas para um período de quatro anos.

Mas a incapacidade revelada pela Universidade Portuguesa no sentido de alterar a referida norma restritiva, entre outras, não deixa de ser um sinal dos tempos e do pouco apego a ideais democráticos. É, por isso, mais frequentemente visível a sua subordinação a projectos racionalistas e tecnocráticos típicos do novo gerencialismo e do admirável mundo novo da organização flexível, com a correspondente recentralização de poderes e com a emergência de novas formas de dominação. Certos tipos de informatização extensiva, por exemplo, revelam-se apurados instrumentos de vigilância e de controlo automático dos actores, em tudo contrários à liberdade académica, à responsabilidade social da Universidade e ao seu aprofundamento democrático.

No entanto, há apenas quatro anos atrás, o objectivo de alterar o modelo de eleição reitoral granjeava elevado consenso. José Manuel Vieira comprometia-se a rever os estatutos no que concerne à eleição do Reitor, pretendendo "alargar a base eleitoral para a sua escolha, contemplando medidas que reforcem o envolvimento e a participação efectiva e universal de toda a Academia" (Programa de Acção, p. 10).

Mais crítico e enfático, António Guimarães Rodrigues afirmava: "Reconhecendoque o actual modelo de eleição do Reitor oferece poucas garantias para a livre expressão e representação dos corpos da Universidade, pretende-se promover a discussão e a revisão daquele modelo, no âmbito da autonomia das Universidades" (Programa de Acção, p. 27).

Trata-se de um objectivo programático que foi diligentemente perseguido (mesmo sem a prometida discussão) mas que não foi possível cumprir, ou de um compromisso eleitoral que estará condenado ao esquecimento pelos antigos candidatos que ganham as eleições?

Em qualquer dos casos, com mais ou menos debate (o que nunca é indiferente), com maior ou menor liberdade de expressão dos diversos projectos ou pontos de vista (veremos, atentamente, como se comportarão os poderes instituídos e os sistemas de comunicação instalados, embora este mesmo texto tenha já sido recusado pela UM-net), a verdade é que a esmagadora maioria daqueles que fazem quotidianamente a Universidade do Minho continuará impossibilitada de se exprimir democraticamente através do voto, isto é, de participar activamente na escolha do futuro da sua instituição, mesmo que esse voto fosse, como no passado, objecto de distintos coeficientes de ponderação. Mas o problema é que, de acordo com a tradição portuguesa, é semprepreferível menos democracia do que democracia "a mais".

Licínio C. Lima
Prof. Catedrático

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